Projeto Escrevivendo

Contribuição de M<aria Inês Zocchio : crônica de Jorge Martins Rodrigues

 

      A EXIBIÇÃO EM SÃO PAULO

Quantos cinemas possui esta Paulicéia querida? Creio que o número oscila entre 3 a 4 dezenas. Um cinema para cada 20 mil pessoas ...

Vão ser inaugurados novos: um todo liró, gracioso à rua Domingos de Morais, quase vis-a-vis ao Phénix; outro à Av. Tiradentes, que será fatalmente um quartel de uma nova espécie naquela via guerreira, outro ainda à Barra Funda, o Roma, nome para atrair uma multidão de patrióticos súditos de sua majestade Victor Emmanuel que moram nas vizinhanças; e o mais luxuoso e confortável, à rua São Bento. Este irá competir com o Triângulo. Ambos lutarão pela preferência do exército de "picturers" que, após o 'footing' ... a pé ou em auto pelas ruas da cidade, dão a vida por uma fitinha.

Qual o mais simpático: o República ou o Santana? Quanto ao primeiro, dizem (os proprietários) ser o preferido da "elite" paulistana. Do segundo os proprietários dizem a mesma coisa ...

O Avenida é o mais ruidoso dos cinemas paulistanos: logo à entrada um 'jazz band' bombardeia o sistema nervoso do público. Na sala de exibição que é úmida mas bem mobiliada, acotovelam-se crianças, velhos, moços e senhores. Mas como são engraçadas as senhoras, os moços e os velhos do Avenida!

O Central é a antítese do seu colega da Av. São João. Como o Paraíso, é um cinema honesto e pacato. Freqüentam-no as meninas bem educadas dos Campos Elíseos e os velhos que sabem ser velhos.

O São Pedro, encravado na fronteira de dois bairros antagônicos — um é inimigo da gravata, outro usa sabonete Windsor — tem, por força da sua posição dois públicos. Representam-nos o 'Paschoal o bicheiro' (que resmunga contra a tirania do colarinho e a exorbitância do preço da cadeira) e a sra. Dona Maria Saudosa de Antanho, que usa "mitenes" negras e é avó de três deliciosas meninas-moças de cabelos compridos.

Outros cines existem com suas fisionomias próprias.

Cada um reflete o seu bairro, "a alma encantadora da rua" de que faz parte. Bonitos uns, feios outros, são todos, porém respeitáveis. Principalmente, os últimos, dentro dos quais o nosso povo esquece, seguindo as aventuras de um filme em séries, toda a série de desventuras que não são de celulóide.


A crônica de Jorge Martins Rodrigues no Diário da Noite fala dos cinemas paulistanos em 1927, momento de transformação da exibição no período mudo. A escassez de boas salas de cinema que se notava em 1925 — segundo Gabus Mendes — já vinha sendo superada. Francisco Serrador já investia na cidade, e novas salas vinham sendo inauguradas no centro.

Exibições: 34

Tags: cinema, critica, escrevivendo, escrita, leitura, oficina

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