Texto de EW

[Karen Kipnis]

RODOLFO

Ali, no fundão do Trianon, pouco frequentado pelos cidadãos , Timba e seu grupo dormem o dia e bebem a noite. Todos pingados. É o seu grupo há uma pá de anos. Todos o acatam. Timba viu quando ela chegou, de madrugada, de barrigão. Encostou e deitou e por lá foi ficando. Já sabia o fim disso. Era parir, desmamar, sumir e largar tudo na mão dele. De novo. No meio dos pensamentos, lentos, sabia que estas coisas eram assim mesmo. Por isso liderava. Ia até ajudar cobrir melhor o mocó. Timba tirava uns dinheiro dos ómi, em troco de cuidar do mocó das pedra. Nem tudo tava nas lata, às vezes tinha que comprar. Enquanto a cria desmamava, Timba foi ficando de olho nele. Sempre que ela deixava, pegava no colo. E sapecou um nome. Rodolfo. Não admitia apelido nem diminutivo. De onde tirou este gosto, não se sabe bem. Diz uma história, que ele achou um pedaço de folha de revista e nela o nome. Sim, sabia ler. Com a ponta do dedo e um olho só. O outro, vazado numa disputa por meia garrafa da boa. Como de sempre, a mãe se escafedeu e aí Timba foi cuidando do Rodolfo. Tudo o que precisava pra ele aguentar a rua e ficar esperto. Às vezes, Rodolfo sobe até o Dante, onde já é visão acostumada dos alunos, na saída da escola. Sempre trazem alguma coisa pra ele. Timba olha, de longe, com orgulho paterno. Não vai até lá, de medo. Certa vez, os seguranças deram uma bicuda na perna do Timba, que quebrou. Timba temia que Rodolfo fosse embora, ou fosse levado. Mas isso não rolou. Agora, Timba cuida do mocó com mais atitude, Rodolfo do seu lado, o tempo todo. Quando reconhece um dos ómi, rosna e desperta Timba do seu sonho de rua. É o seu quinhão, seja lá do que for.

 EW-9/9/2011-Escrivivendo-prof. ª Gabriela

[Samia Schiller]

Essa crônica tem frases curtas,secas, ritmadas e uma boa história. ´

É o padrão EW de qualidade.