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Após o emocionante encontro de # 3, encerrado com as comoventes correspondências de Nelson Freire e seu pai, enfim chegou a hora de encararmos uma outra face da relação entre pais e filhos, ora representada pela
Carta ao pai de Franz Kafka.
Sobre suas mesas, os alunos encontraram um envelope que continha a fac-símile da primeira página manuscrita da carta, de modo que pudessem tomar contato com a materialidade do documento. A caligrafia do autor, a inscrição da localidade, a paginação anotada manualmente, cada uma das primeiras frases, da saudação às mais contundentes frases (que, por estarem na língua alemã, não permitiam à nossa turma nenhuma decodificação).
Antes de partimos para o texto em português (cuja leitura integral já havia sido indicada desde o início da oficina), assistimos aos 15 minutos iniciais do documentário
Wer war Kafka? [Quem foi Kafka?] (2006), do diretor suíço Richard Dindo (
goo.gl/Aoa5uM), que procura explorar aspectos da vida desse escritor. Então, pudemos ouvir a pronúncia em alemão das palavras manuscritas por Kafka, durante a leitura de uma passagem da carta constante no filme.
Finalmente, nos apossamos da tradução para o português e lemos coletivamente o fragmento inicial da Carta ao pai. Embora curto em relação ao livro todo, esse trecho proporcionou uma análise muito aprofundada não apenas daquilo que fazia parte do relacionamento de Kafka com seu pai (e, por extensão, do relacionamento de pais e filhos, de modo geral), mas principalmente de nossa relação com a escrita. É através dela que expressamos o que não podemos verbalizar. Além disso, no processo de escrita conseguimos organizar nossos pensamentos e sentimentos de maneira muito mais clara. Uma vez que todo esse conteúdo amorfo adquire alguma forma por meio das palavras que escolhemos para pôr no papel, sentimo-nos mais capazes de compreender o que acontece conosco e que determina nossa relação com o outro -- a tal ponto que, muitas vezes, a própria escrita já basta. Por isso, há tantas cartas que não encontram destino. Não raro, é mais valioso o processo que o produto, que guardamos numa gaveta ou até mesmo jogamos no lixo.
Voltamos do intervalo com um enigma para resolver. No telão, estava projetado o "Tvgrama 1 (Tombeau de Mallarmé)", de Augusto de Campos, o qual deveria ser decifrado pelos alunos, que também dispunham de uma cópia impressa do poema.
Após alguns minutos, conseguimos desvendá-lo e, então, assistimos ao clip-poema elaborado pelo próprio autor, que, no últimos últimos versos dessa composição, profetizou: "tudo existe/ pra acabar em TV". Essa breve atividade de reorganização, que estava ligada a uma discussão sobre o predomínio do audiovisual na cultura contemporânea, deu lugar a um levantamento de conhecimentos da turma a respeito da estrutura da carta.
Quais seriam as partes estruturantes de um texto epistolar? Num quadro, anotei (tentando seguir uma sequência lógica) todos os elementos citados pelos alunos. Quando concluímos essa fase, movimentei um outro quadro, em que estavam listadas as partes da carta prescritas pelo Anônimo de Bolonha, que havia redigido em 1135 um pequeno tratado sobre as epístolas.
Comparamos ambos os registros e, após verificarmos que a turma já estava dominando devidamente os aspectos gerais do gênero, partimos para uma atividade de troca entre os alunos. Divididos em duplas ou trios, eles leram os textos de seus colegas e, tendo como referência o itinerário das partes constituintes da carta registrado no quadro, discutiram os aspectos positivos daquilo que leram e fizeram apontamentos a respeito do que poderia ser aprimorado.
Ao final da aula, os alunos foram convidados a, a partir do que ouviram dos colegas, realizar uma reescrita da última carta que haviam redigido, incorporando as sugestões que lhes foram dadas.
Abs,
Laion
Material utilizado nesta oficina:
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