Projeto Escrevivendo

Meu centro expandido

 

 

Quando tomo o trem do metrô, em direção à Sé, passo de uma situação emocional a outra. Deixo a periferia da vida, indo ao centro desta.

Quando desço na Sé, e caminho por seu chão sujo e infestado de mendigos, também, sujos e mal cheirosos (a que chamo donos da rua), sinto que mudei de estado d’alma.

Ali, como uma ilha cercada de líquido residual (urina) e de excrementos, ergue-se o edifício setentão da Caixa Cultural, onde às vezes entro, e cuja entrada quase sempre está rodeada de moradores de rua, dos quais tenho de me desviar. Certamente isso levou Guto Lacaz, artista plástico, a dizer, em entrevista na TV, que “a cidade hoje é dos mendigos”.

Lembro-me da antiga Sé. Uma fileira de prédios de estilo, creio, colonial foi derrubada. Então, a Sé se ligou à Praça Clóvis. Nessa derrubada teve fim um antigo cinema. Uma implosão pôs abaixo o Edifício Mendes Caldeira. Estava aberta a área para a construção do metrô.

Se desço a Sé, e penetro na 15 de Novembro e viro na Rua da Quitanda, não sem passar por pedintes, camelôs ou marreteiros, encontro na Álvares Penteado o também antigo, quase centenário, e imponente prédio do CCBB, pertencente ao Banco do Brasil.

Aí, igualmente, tenho momentos de sonho, de devaneio. Nesse local, encontro pessoas, como “dom” Fernando, veterano cinéfilo, entre outros. Comunico-me com as garotas que se revezam na bilheteria. Entre elas, a magra, a robusta, a morena, a loura, a simpática, a charmosa, a bonita, a introspectiva. Vago pelas exposições artísticas, quando existem, sento-me no amplo banco de mármore.

Se não vou para casa de metrô, desço ao Parque Dom Pedro. Antes de tomar o ônibus, visito o supermercado popular, compro laticínios, principalmente; às vezes, revistas antigas numa banca especializada. Nas banquinhas instaladas na rua, sente-se o odor de churrasquinho, de milho verde, de cachaça vendida a granel, de pastel, de abacaxi cortado em fatias.

No antigo Parque Dom Pedro, havia o Parque Shangai, isto é, um parque de diversões. Cobrava-se ingresso. Havia, no atual terminal de ônibus, um local gramado e cheio de árvores. As pessoas deitavam sob essas árvores. Creio que faziam piquenique.

 

 

 

Meu centrão paulistano

 

 

Andando pelo centro velho me surpreendo com a mudança que ali se opera. Trata-se de uma boa surpresa, porque gosto desse aspecto, que pretendo destacar.

Quero dizer que não se trata do calçadão propriamente dito. Transformar as ruas do centro no chamado calçadão foi algo sensato. As ruas são relativamente estreitas, o movimento de pessoas é grande. O caos estaria instalado ali se o trânsito de veículos não tivesse sido limitado e regulamentado.

Porém, desejo falar na transformação do calçadão em extensão das salas de alguns bares e restaurantes. Isso agrada ao ver, pelo menos do meu ponto de vista. Cadeiras e mesas postas ao ar livre, plenas de pessoas, na maioria adultos jovens e conversadores. Há um quê de romântico nisso! Pareceria uma situação parisiense? Pergunto porque não posso afirmar. Não conheço Paris, a não ser por imagens e comentários.

Como seria bom ver todo o centrão lotado de mesinhas e cadeiras ocupadas pela moçada alegre e feliz. Isso faria o local sempre limpo e, talvez, livre da presença incômoda dos mendigos. Acrescentemos a essa situação a presença de um policiamento polido e intensivo, o que atrairia mais turistas locais e de outras partes. É isso um sonho; mas, é bom sonhar. Sonhar com um centrão mudado, porque belo ele é.  


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Tags: almeida, escrevivendo, escrita, guilherme, leitura, oficina

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Comentário de Samia Schiller em 23 outubro 2011 às 10:01
As duas tem o jeitão do Sebastião.

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