TERCEIRO ENCONTRO DO ESCREVIVENDO FALAS DE AMOR
Chegamos ao terceiro encontro do módulo que acontece na Casa das Rosas, dedicado ao discurso amoroso. E como uma boa história de amor, nossa oficina tece-se no difícil equilíbrio entre afetos. Entre encanto, envolvimento, entrega e crise, experienciamos todos os “papéis” de uma relação. Das exigências e deveres de um relacionamento, vivemos também esses anacronismos; pois é sempre o tempo, com seus descompassos, que pauta este Encontro.
Tempo dos processos, tempo da escuta, tempo do silêncio, do aprender a calar-se, tempo das abnegações e das renúncias – descobrimos, desde os desequilíbrios, esta necessária medida. Pelo olhar do outro, às vezes generoso e exigente, outras repreensivo, muitas vezes frustrado, desvelamos a nossa outra face, que só a alteridade oferta. E descobrimos que o Outro ensina o Eu a ser melhor.
Nesse encontro em que terminamos esta primeira rodada de leituras da produções, sem conseguir, no entanto, esgotar a Leitura, o horizonte parece ter sido mesmo o que temos pela frente. Isto que as relações vivas oferecem: a possibilidade de se rever e se reinventar.
Já na beira do término deste terceiro encontro – dizem que quando se chega a um terceiro encontro, as expectativas já estão nas alturas... – entramos em contato com a nova proposta para a nossa relação. A partir da leitura dos textos abaixo, cada um escreverá uma narrativa de amor que descreva uma relação com o sagrado (não apenas no sentido “religioso”), pensando especificamente na dimensão corpórea (naquilo que nos chega pelos sentidos, ou que deles deriva).
O primeiro desafio é reconhecer, neste mundo imenso, o que nos é sagrado. Feito isso, encaramos a dificuldade de dar corpo ao imaterial, e de fazer com que a linguagem dê conta da tarefa.
Na semana que vem, discutiremos os poemas e leremos os resultados das produções. Ainda nesta semana, as produções dos escreviventes para a primeira proposta será postada aqui!
e com a ansiedade típica do amor,
esperemos até sábado...
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Invocação
(Maria Bethânia)
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Deus dos sem deuses
deus do céu sem Deus
Deus dos ateus
Rogo a ti cem vezes
Responde quem és?
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Serás Deus ou Deusa?
Que sexo terás?
Mostra teu dedo, tua língua, tua face
Deus dos sem deuses
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NOITE ESCURA
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Em uma noite escura
De amor em vivas ânsias inflamada
Oh! Ditosa ventura!
Saí sem ser notada,
Já minha casa estando sossegada.
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Na escuridão, segura,
Pela secreta escada, disfarçada,
Oh! Ditosa ventura!
Na escuridão, velada,
Já minha casa estando sossegada.
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Em noite tão ditosa,
E num segredo em que ninguém me via,
Nem eu olhava coisa,
Sem outra luz nem guia
Além da que no coração me ardia.
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Essa luz me guiava,
Com mais clareza que a do meio-dia
Aonde me esperava
Quem eu bem conhecia,
Em sítio onde ninguém aparecia.
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Oh! noite, que me guiaste,
Oh! noite, amável mais do que a alvorada
Oh! noite, que juntaste
Amado com amada,
Amada já no amado transformada!
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Em meu peito florido
Que, inteiro, para ele só guardava,
Quedou-se adormecido,
E eu, terna, o regalava,
E dos cedros o leque o refrescava.
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Da ameia a brisa amena,
Quando eu os seus cabelos afagava,
Com sua mão serena
Em meu colo soprava,
E meus sentidos todos transportava.
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Esquecida, quedei-me,
O rosto reclinado sobre o Amado;
Tudo cessou. Deixei-me,
Largando meu cuidado
Por entre as açucenas olvidado.
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(São João da Cruz. In: Obras Completas. Rio de Janeiro: Vozes)
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I
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É bom que seja assim, Dionisio, que não venhas.
Voz e vento apenas
Das coisas do lá fora
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E sozinha supor
Que se estivesses dentro
.
Essa voz importante e esse vento
Das ramagens de fora
.
Eu jamais ouviria. Atento
Meu ouvido escutaria
O sumo do teu canto. Que não venhas, Dionísio.
Porque é melhor sonhar tua rudeza
E sorver reconquista a cada noite
Pensando: amanhã sim, virá.
E o tempo de amanhã será riqueza:
A cada noite, eu Ariana, preparando
Aroma e corpo. E o verso a cada noite
Se fazendo de tua sábia ausência.
.
(Hilda Hist. “Ode descontínua e remota para flauta e oboé”. In: Júbilo, memória, noviciados da paixão.)
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