Projeto Escrevivendo

QUINTO ENCONTRO DO ESCREVIVENDO FALAS DE AMOR

E o tempo, sempre tão exíguo, resolveu mostrar a outra face: pois que no último sábado, no quinto encontro do Escrevivendo: Falas de amor, conhecemos um tempo generoso e cheio de possibilidades. Que nos permitiu um encontro gostoso, sem grandes correrias ou atropelos. Finalmente!

Começamos o dia fazendo uma análise de alguns exemplos de textos reescritos para a oficina. Primeiro, um texto que se apresentou em prosa poética e que, na reescritura, ganhou estrutura de poema, com versos livres. Pudemos perceber as alterações no sentido, no significado e na recepção do texto a partir da nova forma. Também analisamos as alterações de pontuação e as mudanças de sentenças, buscando entender de que maneira a reelaboração do texto resolveu alguns problemas de ritmos e fluxos da primeira versão. Em seguida, tivemos contato com outro texto em suas duas versões. Apesar de não ter nenhuma alteração nem de pontuação e nem de “conteúdo” (de palavras, versos), a reescrita do texto apresentou algumas mudanças na forma, na quebra de versos, na espacialidade do poema, na geografia das palavras. Essas eram alterações em que a forma visual do poema dialogava com o sentido das próprias palavras – e assim, pudemos averiguar como a forma se relacionava com a intencionalidade do poema, contraponto a recepção e a nossa leitura com o sentido do texto (e o autor que estava ali para nos ajudar...)

Mais do que entender as especificidades desses dois textos, a atividade nos permitiu consolidar um processo, já em curso desde o começo da oficina, de entender a linguagem a partir daquilo que a literatura nos apresenta. Pois se há uma língua comum, que utilizamos para nos comunicar, para trabalhar, há também uma linguagem que a literatura possibilita, muitas vezes feita de suas próprias impossibilidades. Tenho insistido no fato de que existem as normas (e elas estão disponíveis a todo tempo, para todos) mas que também existe uma região, regida pela literatura, onde o que predomina é uma linguagem – entender suas possibilidades e suas criações é parte do nosso objetivo.

Pensando nisso, ainda, lemos dois excertos do livro “Fragmentos de um discurso amoroso”, de Roland Barthes. No primeiro deles, denominado “Drama”, o autor propõe a tensão nascida da impossibilidade de escrevermos, nós mesmos, a nossa história de amor. A confissão, o diário, a narrativa de si estariam fora da escritura, e portanto seria sempre o Outro que escreve. Já em “Escrever”, Barthes apresenta a tensão do sujeito diante do “desejo de exprimir o sentimento amoroso numa criação (particularmente de escrita)”. Ele apresenta o mito socrático e o mito romântico como duas ferramentas que nos fizeram acreditar que o amor deveria se sublimar em criação estética para, em seguida, mostrar como, nesse caso, a linguagem está desajustada: ou ela é muito (pela expansão do eu e a submersão emotiva) ou muito pouco (pela ilusão de expressividade e pelos próprios códigos que o amor a rebaixa e reduz). A escrita exigiria um sacrifício do próprio Imaginário: “alguém deveria me ensinar que não se pode escrever sem fazer o luto da própria sinceridade”...

E Barthes termina este trecho com uma afirmação que deixo aqui destacada, pois será sempre o nosso ponto de partida, e de chegada:

“Saber que não escrevemos para o outro, saber que essas coisas que vou escrever jamais me farão amado de quem amo, saber que a escrita não compensa nada, não sublima nada, que ela está precisamente ali onde você não está – é o começo da escrita”.

Pensando nessa discussão, partimos para a próxima e última proposta de escrita. Dividimos a turma em duplas, e cada um tinha que contar ao outro uma história de amor – inventada, vivida, construída, ouvida ou sublimada, o mais rica em detalhes possível. Daí, quem ouviu teria de escrever essa história (ou a partir dessa história), mas com um detalhe: eles sortearam um CENÁRIO (retirado do livro “106 falas de amor e seus cenários”, de Cyana Leahy) que teria que estar dentro da narrativa. A história poderia se passar nesse cenário, ou então ele aparecer como referência, como memória, enfim: aí é a inventividade, não é? O desafio consiste em descobrir, em primeiro lugar, o que está na escrita para cada história ouvida. E depois, adaptá-la a partir do que o cenário sugere. Eu alimentei a possibilidade de narrar a partir do Outro, sempre presente e oculto na narrativa de amor.

E para vocês, do NING, que quiserem realizar essa proposta, sugiro pedir para algum conhecido que conte a sua história de amor e, a partir disso, escolha um cenário que deixo aqui disponível (como uma pequena fotografia grávida de histórias):

Colégio

Teatro

Viagem de férias

Encontro às cegas

Metrô

Oficina mecânica

Casa de amigos

Festa de carnaval

Cinema

Trabalho

Faculdade

Exibições: 50

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